As provações do Inimigo

E num dia em que os filhos de Deus vieram apresentar-se perante o SENHOR, veio também Satanás entre eles. Então o SENHOR disse a Satanás: Donde vens? E Satanás respondeu ao SENHOR, e disse: De rodear a terra, e passear por ela."

(Jó 1:6,7)

O episódio descrito nos versículos 6 a 22 do primeiro capítulo de Jó nos dá uma visão do centro do mundo espiritual, na presença do próprio Deus. Não sabemos como foi revelado a quem o descreve para nós, mas, como todos os livros da Bíblia, foi por inspiração do Espírito Santo de Deus.

Jó e os outros personagens mencionados no livro não tinham conhecimento dele, nem do que se segue no capítulo 2, versículos 1 a 7. Mas essas cenas têm permitido aos leitores através dos séculos, incluindo nós, a compreender e interpretar algumas das coisas incomuns que acontecem com o povo de Deus.

Aprendemos que, naquela ocasião, alguns milênios atrás, os “filhos de Deus”, seres espirituais inteligentes por Ele criados, vieram perante o SENHOR. A expressão “filhos de Deus” também é usada na Bíblia para aqueles da raça humana que têm uma natureza piedosa e reta (Gênesis 6:2), e aqueles que nascem de novo pelo Espírito Santo mediante a fé em Seu Filho (João 1:12).

Mas aqueles eram espíritos, anjos, chamados “filhos de Deus” nas Escrituras hebraicas porque foram feitos por Deus. São responsáveis e prestam contas a Ele pelos seus atos, e vieram dar seus relatórios naquela ocasião. Entre eles estava Satanás (que significa adversário, acusador) e ele teve que explicar de onde viera. Sem dúvida o SENHOR sabia muito bem, mas mesmo assim Satanás precisava explicar ele próprio. Ele deu uma resposta um tanto vaga: “De perambular pela terra e andar por ela” .

Embora não tenham corpos físicos, todas as criaturas espirituais, ao contrário do Deus criador, estão limitadas pelo tempo e pelo espaço como nós. Muita gente não sabe disto e assume que eles têm atributos divinos.

Outra suposição que se faz, cujas origens se encontram no folclore medieval, é que Satanás e os seus anjos residem no inferno. Não estão ali, e ainda vai demorar bastante até que sejam lançados nele, o “lago de fogo e enxofre”. Muitos “espíritos imundos”, ou demônios, estão presos noutro lugar chamado Abismo (Lucas 8:31, Apocalipse 9:2).

Satanás atualmente é o “príncipe do poder do ar” (Efésios 2:2) e tem comando sobre um grande exército de anjos rebeldes que o servem e executam suas ordens. Eles têm tanta liberdade quanto nós para se moverem sobre a terra, com a vantagem de não dependerem de meios de transporte.

A Palavra de Deus nos previne: “Sede sóbrios; vigiai; porque o diabo, vosso adversário, anda em derredor, bramando como leão, buscando a quem possa tragar” (1 Pedro 5:8). Satanás ainda pode ir diante de Deus para acusar o Seu povo. O inferno, chamado “lago de fogo e de enxofre”, é o lugar preparado para ele e para os seus anjos, mas nem eles nem ninguém mais ainda se encontra ali.

O inferno, também em decorrência dessas fábulas medievais, é frequentemente usado como representante das forças e influências do mal. Vai, um dia, ser o destino delas, mas é um lugar e não tem personalidade. Não existem as forças infernais!

Em traduções mais antigas para o português, a palavra hebraica “sheol” é traduzida como inferno, sendo que ela na realidade significa “sepulcro, profundezas, pó, ou morte”. Por causa disto há mal-entendidos, por exemplo, o que o Senhor Jesus disse a Pedro: “… sobre esta pedra edificarei a minha igreja, e as portas do “inferno” não prevalecerão contra ela” (Mateus 16:18). O original grego “hades”, equivalente a “sheol”, foi aqui traduzido incorretamente como “inferno”. É a morte que não prevalecerá contra a igreja, referindo-se o Senhor à ressurreição dos mortos quando da Sua vinda para receber a Sua igreja nos ares (1 Tessalonicenses 4:17).

Voltando à nossa cena inicial, vemos Satanás mostrando o seu caráter de adversário e acusador de Jó, um homem íntegro, reto, temente a Deus, e que se desviava do mal. Satanás deu a entender que ele só tinha esse bom caráter porque, agindo assim, o SENHOR protegia a sua família e lhe dava prosperidade. Em sua opinião, Jó blasfemaria na face de Deus se tudo lhe fosse tirado.

Satanás sabia que não podia tocar em Jó sem a permissão de Deus, pois o havia “cercado com sebe”. É um conforto sabermos que há uma “sebe” colocada em torno de todo o crente hoje, e Satanás não pode nos tocar se Deus não o permitir. Se o SENHOR o permitir, será para o Seu bom propósito e o nosso bem, como aconteceu com Jó, mesmo sem saber os benefícios que lhe adviriam. Nós sabemos que nos trará a paciência, e oportunamente a perfeição, sem faltar em coisa alguma, e a coroa da vida (Tiago 1:3-4,12).

Satanás sabia que muita gente age piedosamente quando tudo vai bem, e busca as bênçãos de Deus. A adversidade expõe a falsa religiosidade, assim como fortalece a verdadeira fé ao fazer com que os verdadeiros crentes gozem a vitória que alcançam.

Só Deus conhece nossos corações e sabe quão forte é a nossa fé. Ele nunca permitirá que algum dos Seus seja provado além das suas forças. Por outro lado, Ele algumas vezes permite que Satanás nos tire as coisas em que nos apoiamos. Quando nos sentimos inseguros, incapazes e perdidos neste mundo é quando nos socorremos em Deus e experimentamos a Sua forte mão em nossa vida.

Este episódio também nos mostra que o SENHOR é soberano sobre nossas vidas, e a influência de Satanás está sob o Seu controle. Na realidade, o mal que Satanás é autorizado a nos causar é parte do propósito que Deus tem de preparar para Si um povo que veio a temer, amar e louvar a Ele mediante experiência própria. Podemos não compreender porque o SENHOR às vezes nos permite sofrer, mas Ele nunca é surpreendido pelos nossos dissabores e Ele nos ama, nunca nos deixa e é sempre compassivo.

Satanás e os seu anjos serão expulsos de uma vez dos céus e precipitados à terra quando perderem uma batalha decisiva no céu no meio do período da tribulação, segundo lemos em Apocalipse 12: 7 a 9. A partir de então ele não poderá mais acusar os irmãos diante de Deus.

Três anos e meio depois, ele será preso no Abismo durante todo o período do milênio (Apocalipse 20:1-3), ao fim do qual ele será solto para tentar as nações. Haverá uma batalha final, em que o Senhor Jesus Cristo o derrotará com todos os que o acompanharem, e ele será lançado no inferno, o “lago de fogo e enxofre”, por toda a eternidade, com os seus anjos.

autor: R David Jones.