Chamado para Obra Missionária: George Orr

MINHA CONVERSÃO E CHAMADO

por George S Orr

Nasci em Dublim, capital da Irlanda, no dia 27 de dezembro de 1918, o mais velho de 7 irmãos, e não posso deixar de mencionar as orações de meus pais e o ambiente cristão em que fui criado.

Num domingo cedo, na minha infância, um irmão missionário na Índia veio almoçar em nossa casa depois da Ceia do Senhor. Dizem que ele me tomou nos braços e orando a Deus pediu para que eu fosse salvo e me tornasse um missionário.

Quando eu tinha seis anos de idade, alguém que me desejava bem e tinha um cuidado pela minha alma, pediu que eu assinasse um papel confessando meus pecados e aceitando a salvação. Fiz isto para agradar, mas não era do coração e sabia que não era salvo.

Comecei a trabalhar aos 14 anos numa importadora de chá. No serviço entrei em contato com alguns crentes que tentavam forçar ou me embaraçar para que eu me salvasse, mas, por ser tímido, não gostava de ser encurralado e me tornei um adolescente rebelde.

Cheguei aos 17 anos, ainda no caminho espaçoso que conduz a perdição. Mas Deus foi misericordioso, e na memorável noite do dia 23 de abril de 1936, eu estava numa reunião para a pregação do Evangelho, tendo sido convidado de uma maneira tão graciosa, por um irmão idoso, que eu não pude recusar.

Um missionário da Jamaica estava pregando em Êxodo, capitulo 2, sobre Moisés, o bebê condenado a morrer, mas que foi salvo pela filha do rei. Enquanto ele falava tive uma relação pessoal com Deus. Eu me reconheci como um pecador e implorei para que Ele olhasse para a cruz em vista dos meus pecados. Que momento incrível quando me vi incluído na obra de Cristo na cruz, meus pecados lavados e perdoados.

Tudo mudou quanto as minhas perspectivas e prioridades. Comecei a participar de todas as reuniões da igreja local, e depois de algum tempo fui batizado e recebido à comunhão da igreja. Comecei a me envolver com as atividades da igreja e posso me lembrar do dia em que, com joelhos tremendo, subi em uma plataforma para pregar pela primeira vez.

Deus, na Sua própria maneira, fez-me pensar no Brasil e na Sua obra neste grande país. Os irmãos da igreja local tinham uma reunião para oração por missionários, onde liam e apresentavam as características de vários países, o trabalho de Deus neles, os missionários e os problemas que enfrentavam, e orávamos por eles. Às vezes recebíamos visitas de missionários que nos contavam algo das suas experiências na obra do Senhor.

Durante este tempo, reli o livro "Aventuras com a Bíblia no Brasil" de Fred Glass, que eu tinha recebido como prêmio da escola dominical anos antes. O livro descrevia sobre o Brasil rural sem falar nada das grandes cidades como Rio de Janeiro e São Paulo, que viríamos a conhecer alguns anos depois.

Comecei a escrever a um missionário do Brasil que morava na Inglaterra querendo saber mais a respeito do país e do trabalho lá realizado. Comecei a sentir que deveria ir e ajudar na obra de Deus. Mas então, em 1939 começou a Segunda Guerra Mundial e toda a navegação de passageiros civis parou. Mas mesmo durante a guerra a idéia não me deixou e era assunto de muita meditação e oração.

No final de 1941 uma moça chamou-me a atenção, e depois de muita oração e consideração eu combinei um encontro para uma curta caminhada. Eu queria ter certeza que era a vontade do Senhor, e que ela também teria o desejo de servir ao Senhor onde quer que Ele guiasse. Portanto uma das primeiras coisas que disse a ela foi "Você já teve pensamentos sobre servir a Deus em outro país?". Tendo estabelecido que tínhamos isso em comum, retornamos à casa dela praticamente noivos. Martha e eu nos casamos em 4 de abril de 1944, e até agora ela tem sido uma preciosa ajudadora e é amada por todos que a conhecem.

A guerra ainda estava em andamento e era um tempo quando o povo tinha só o suficiente para se alimentar e tudo era racionado, e eu comecei a pensar que Deus talvez poderia sustentar a mim no Brasil, mas poderia cuidar de mim e de minha esposa também? Continuei a orar e procurar a direção de Deus.

A guerra terminou no final de 1945 e depois de um tempo os navios começaram a deixar os portos da Irlanda para países distantes. Enquanto ainda procurava a confirmação quanto a vontade de Deus para nós, certa noite, em uma reunião de ministério, o pregador lendo Jeremias, capitulo 1, uma palavra me chamou a atenção: IRÁS ("a todos a quem eu te enviar, irás; e tudo quanto eu te mandar, falarás” v.7).

Falei aos irmãos da igreja quanto ao nosso objetivo e eles estavam contentes em nos apoiar e nos recomendar para a obra do Senhor. Depois disto arrumamos as coisas, compramos passagens, e no dia 18 de outubro de 1947, deixamos a nossa terra natal rumo ao Brasil com um certo temor e conscientes da nossa fraqueza, mas confiando no Senhor. Ele nunca nos falhou!

Chegamos no Brasil no dia 5 de novembro de 1947, com um filho de dois anos de idade, sem ter onde morar, não conhecendo ninguém e não sabendo falar português.

Foi-nos sugerido que deixássemos a maior parte da nossa bagagem na casa de oração em Santos e ficássemos algum tempo com um missionário inglês em São Paulo (com quem não havíamos nos encontrado antes). Algumas semanas depois, houve uma enchente em Santos que atingiu a casa de oração e estragou grande parte da nossa bagagem, incluindo os livros.

O Sr. Hollywell, o missionário inglês, nos ajudou nos primeiros dias até acharmos um lugar onde morar, era um homem muito ocupado, pois sabia que seu tempo era curto. Ele morreu 6 meses depois, de câncer.

Uma vez que aprendemos o suficiente da língua portuguesa para podermos nos comunicar com as pessoas, foi um grande privilégio contar-lhes a boa notícia do amor de Deus, da morte de Seu Filho e salvação disponível a todos.

Durante a maior parte dos nossos anos no Brasil, moramos em São Paulo e Paraná, mas em muitas ocasiões viajamos a outras partes, do Norte, na beira do Rio Amazonas, ao Sul, no Rio Grande do Sul, para apontar pecadores ao Senhor Jesus Cristo e ajudar e ter comunhão com o povo de Deus.

Deus tem sido bom, Ele nos abençoou com mais seis filhos e nos acompanhou a cada passo do caminho. O que temos feito por Ele, não é preciso dizer; tudo tem sido anotado por Aquele que pode avaliar o que foi de ouro, prata, pau ou palha.

Nos últimos anos devido a problemas de saúde ligados a idade avançada, e minha esposa tendo de passar por algumas cirurgias, não tem sido possível voltar, mas ainda mantemos contatos e estamos a par da obra de Deus no Brasil via cartas, e-mails e telefonemas. Continuamos a orar pelo trabalho e pelos amigos que fizemos.

Em agosto, deste ano, tive que instalar um marca-passo no meu coração, ao entrar na sala de cirurgia eu disse aos que estavam lá: "Se algo der errado, não se preocupem, minha passagem ao céu já está paga!".

Como é pouco o que fazemos por Ele, quando consideramos o muito que Ele tem feito por nós!
 

Adendo

George Orr foi levado para a presença do Senhor em 18 de maio de 2006. Posteriormente seu filho Alan gentilmente nos forneceu mais detalhes da sua vida, que transcrevemos a seguir:

Quando George nasceu, sua mãe escreveu um poema contendo sete estrofes, das quais a terceira vai assim:

"Senhor, oramos que o receba de volta de nossas mãos,
Nós o cederíamos a Ti sem tardar.
E que nestes últimos dias, mesmo ele
Permaneça em pé na brecha que se abre, por Ti."

Sua mãe foi chamada para o lar na glória quando ele tinha 17 anos de idade.

(Depois de chegar pela primeira vez ao Brasil,) tendo já aprendido o suficiente do idioma, ele teve o grande privilégio de proclamar o Evangelho.

Eles logo se mudaram para Santo André, satélite de São Paulo, e pouco depois para um lugar afastado, nas divisas de Santo André, o povoado de Vila Luzita, onde uma igreja eventualmente se formou e ainda se reúne ali até hoje. Enquanto estavam em Santo André seu segundo filho Alan nasceu.

Seu movimento seguinte foi para a cidade de Niterói, do outro lado da baía de onde está o Rio de Janeiro, onde procuraram também ajudar as igrejas ao redor daquela grande metrópole. Seu terceiro filho Kenneth nasceu em Niterói.

Mudaram-se então de volta para o Estado de São Paulo e ajudaram na igreja em Souzas, perto da grande cidade de Campinas.

Sua próxima mudança foi para o Estado do Paraná, onde moraram numa pequena casa atrás da casa de oração de Ahú de Baixo e ajudaram no trabalho ao redor daquela grande cidade. Aqui foi onde nasceu seu quarto filho, Eric.

Em seguida, mudaram para o norte, ao Estado de Minas Gerais, onde por alguns anos ele trabalhou como empregado na construção de uma grande usina hidroelétrica durante o dia, e continuou a evangelizar à noite. Dali ele também auxiliou igrejas como a de São Joaquim da Barra no Estado de São Paulo e igrejas no Estado de Minas Gerais. Hilda, a sua primeira filha, nasceu ali.

Depois de uma temporada na Irlanda do Norte em 1957/58 eles voltaram para ajudar a pequena igreja em Vila Luzita por alguns anos. Edna, sua segunda filha e Leslie, seu quinto filho e caçula, nasceram em Vila Luzita.

Então mudaram para o Estado de Santa Catarina, ao sul do Paraná, morando na cidade de Joinville onde algumas almas foram salvas.

O movimento seguinte foi de volta para o Estado do Paraná, primeiro para a cidade de Maringá e mais tarde mais para o interior, para a distante área rural de Japurá. Havia uma igreja em Japurá e mais tarde foi instituído um centro para conferências. Enquanto estavam ali, puderam ajudar igrejas novas como aquelas em São João do Ivaí, Paranavaí e Umuarama.

Alguns anos depois mudaram para um vilarejo chamado Quatro Barras, nos arredores de Curitiba, onde deram início a uma pequena igreja, e puderam ajudar outras igrejas inclusive a que se encontra em Vila das Oficinas. Em Quatro Barras também se estabeleceu um centro de conferências.

Continuaram trabalhando a partir da base em Quatro Barras até que, devido a problemas ligados ao avanço da idade, não puderam regressar mas continuaram em contato com os santos ali por correspondência, e-mail ou telefone.

Embora tenham passado a maioria dos seus anos no Brasil nos Estados de São Paulo e Paraná, muitas vezes viajaram para outras partes do país, desde o norte, nas margens do Amazonas, ao sul no Rio Grande do Sul, para apontar os pecadores a Cristo e ajudar, e ter comunhão com o povo de Deus.

Eles tiveram experiência das bênçãos e da bondade de Deus e da Sua presença em cada passo do caminho. O que fizeram por Ele foi tudo anotado por Aquele que é capaz de avaliar o que foi ouro, prata, madeira ou palha. Quão pouco é o que é feito por Ele, quando pensamos no que Ele fez por nós!

No início de maio de 2006 ele foi hospitalizado várias vezes. No dia 18 de maio ele foi chamado ao lar para estar com o Senhor.

Ele gozava do carinho de muitos e isto se refletiu nos e-mails que têm chovido do Brasil recentemente. Ele amava o povo brasileiro e os brasileiros, por sua vez, amavam George e Martha.

Como sinal do seu carinho o povo decidiu dar o nome de "Dona Martha Orr" a uma pequena escola. Uns dois meses antes do seu passamento ele recebeu um e-mail de uma igreja no Brasil que lhe deu muita alegria. O texto dizia que "Cornélio quer que o Senhor George saiba que ele se tornou um cristão." Cornélio tinha resistido ao Evangelho por muito tempo, mas agora, que alegria quando uma semente plantada décadas atrás dá fruto.

2 Julho de 2006

autor: R David Jones.